sábado, 7 de junho de 2008


MULHER PARA TODOS OS GOSTOS - E MAUS GOSTOS


Mulher-Melancia. Essa era a gota que faltava para que eu realmente perdesse a paciência e resolvesse escrever a respeito das mulheres. Relutei tanto em falar sobre esse assunto, porque penso que outras pessoas já o fizeram, portanto ele se esgotou. Mas quero a minha parte nesse quinhão. Quero a minha fatia nesse bolo de expressar que, enquanto mulher, me sinto diminuída diante da supervalorização dessas novas mulheres que mais parecem vacas holandesas. Com todo respeito às vaquinhas. E antes que me venham dizer que faço isso por puro despeito ou inveja, já alerto que aí está o engano. Se eu tivesse que ter inveja, ou melhor, se tivesse que escolher outras mulheres como modelo de conduta, beleza, retidão, inteligência e elegância, certamente essas mulheres-frutas estariam de fora da lista. Além da minha mãe – a primeira e grande mulher da minha vida – e das despojadas imigrantes (portuguesa e italiana) da minha família, existem inúmeros exemplos, de todas as épocas, que admiro e que, de fato, dão orgulho à classe: a pureza e abnegação de Santa Clara, a dedicação de Madre Teresa, a coragem de Joana D’Arc, a audácia de Maria Quitéria, a convicção de Olga Benário, a beleza cândida de Audrey Hepburn, a intensidade de Florbela Espanca, o espírito inovador de Tarsila, o pioneirismo de Marie Curie, o pulso firme de Margareth Tatcher, a sensibilidade de Cecília Meireles. Fora as tantas anônimas com as quais dou de cara todos os dias cá em São Paulo, sempre andando depressa com medo de perder a condução, cochilando como podem nos espaços apertados do metrô, indo ou vindo de mais uma jornada puxada de trabalho.

Não que eu diga que mulheres plastificadas e esculpidas nas mesas de cirurgia também não trabalhem. Trabalham sim. Trabalham as coxas, os glúteos, o peito, os bíceps... E no fim se esquecem de contratar um bom professor de português para não nos causar vergonha alheia quando dão entrevistas. O fato é que já me cansei de ver, praticamente em toda parte, o lombo da Mulher-Melancia, reportagens sobre a sua (muy interessante) vida, quais seus projetos para o futuro (jornalistas de fofocas adoram essa expressão. Será que não se tocam da ridiculice da pergunta? Se é projeto, é claro que tem que ser para o futuro? Alguém já elaborou algum projeto para o passado?), em quantas revistas ela apareceu pelada, para quando é o seu cd. É... ela está preparando um cd! Esses dias ela deu uma declaração de que está para lançar um cd só que ainda não sabe exatamente quais as músicas, nem qual o estilo. Isso é que é profissionalismo!!

Não faz muito tempo, eu estava conversando com um amigo e entramos no assunto de preconceito. Eu, que não sou e nem quero ser santa, disse a ele que não tenho nenhum tipo de preconceito, mas se tem uma coisa que, como dizem os portugueses, “me mete nojo”, são pessoas burras que insistem em ser burras. Mulheres desse naipe são exatamente assim. Não é possível que mulheres da espécie da Melancia não tem consciência de que hoje sua imagem é explorada de todas as formas, de que as pessoas as vêem como mercadoria para a mídia, de que beleza é temporária, de que suas entrevistas são um amontoado de nadas. Nem passamos do meio do ano e já começam a pipocar nos programas de fofocas e nas revistas de futilidades as brigas entre várias ex-modelos, ex-bbb’s, ex-do Ronaldo, ex-sabe-se-la-o-que, para ver quem vai ser a nova rainha da bateria de tal escola de samba. Como eu sei disso? Ora, uma zapeada de nada que a gente dá pelos canais abertos durante dia, basta para ver a quantas chegou a imagem da mulher no Brasil. Uma, com um traseiro do tamanho do de um hipopótamo diz que vai fazer um cd mas não sabe nem do que, outras que gastam mundos e fundos (e pensões de boleiros e pagodeiros) para fazerem plásticas numa competição idiota para ver quem pode se falsificar mais, outras promovem barracos públicos a fim de sair num destaque de escola de samba – passando um ano inteiro de suas vidas medíocres só pensando nuns poucos dias de carnaval.

Gretchen, Rita Cadillac, Carla “I de escola e E de isqueiro” Peres, Ninja do Funk, Bandida, Mulher-Samambaia, Mulher-Melancia, Mulher-Moranguinho, Mulher-Melão, pioneiras do zerismo à esquerda e da completa ausência de talento... Gostaria de saber dos homens, sinceramente, se algum de vocês se casaria com uma delas. Se a resposta for não, então minha teoria está certa de que esse deslumbramento é temporário, que durante o tempo que passam em evidência, essas mulheres não passam de pedaços de carne que abrem a boca só para falar inutilidades e que nada melhor do que uma mulher muito, muito normal do seu lado. Agora, se a resposta for sim, então definitivamente mau gosto não se discute. Se lamenta.

Nessa semana fui ao teatro assistir à comédia As Olívias Palitam. Excelente, com um humor de muito bom gosto. As quatro mulheres que fazem a peça são magrelas (como elas mesmo citam) e que estão à margem do padrão de beleza atualmente estipulado pelas mídias. Mas e daí? Cada uma delas acaba por se tornar belas em conseqüência do talento, do humor, da espirituosidade e da inteligência que possuem. Às vezes eu brinco dizendo que Deus, quando cria as mulheres, ou dá peito ou dá cérebro. Claro que isso é uma grande maldade da minha parte.Mulheres bonitas podem ser inteligentes e vice-versa, mas o que me irrita é essa corrida tresloucada da mulherada pela beleza a qualquer custo. Não estamos vivendo na Grécia antiga, onde os considerados imperfeitos eram descartados. Não faz sentido ver mulheres até se endividando em nome da vaidade. Isso porque devem ter como espelhos essas “frutas” que estão na moda, mas que daqui uma década elas serão as “famosas quem?”. Diante disso, tem momentos em que chego a pensar: “maldita hora em que aquelas feministas queimaram sutiãs nas ruas!”. De uns anos pra cá, as mulheres conseguiram praticamente tudo que almejavam, mas por outro lado, parece que estamos voltando ao ponto de onde partimos: a tentativa de resgatar o respeito que essas viciadas em silicone estão fazendo questão de pôr abaixo.

Mais uma vez faço questão de esclarecer para os que ainda acham que escrevo isso por inveja: entre ser estonteantemente bela e ser uma típica nerd, eu fico com a segunda opção, pois sei que quando eu ficar velha só vou poder contar com os conhecimentos que acumulei durante a vida e não com os olhares e elogios que eu poderia ter ganhado, mas que em nada acrescentariam.

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foto: Florbela Espanca - poetisa portuguesa