quinta-feira, 16 de junho de 2011

 
                   O Japão é pop!  

Com a proximidade da Festa da Cerejeira, essa página não poderia ficar alheia à cultura japonesa. Sobretudo à cultura pop, que abrange filmes, tokusatsu ou live actions (aqueles seriados de super heróis que são famosos há tempos), animes (desenhos), música (j-rock, j-pop), danças, mangás (os quadrinhos), vestimentas e vocabulário próprios e tão peculiares. Enfim, tudo o que os otakus (fãs desse universo) e saudosistas adoram e consomem (e eu me ponho no meio disso). De algumas décadas para cá o Japão passou de importador à exportador de moda e costumes, influenciando o cinema, literatura, artes e culinária. E mesmo se mostrando hoje uma nação moderna, produtiva, ágil, jovem, industrializada, urbana e globalizada, o Japão ainda mantém suas tradições, crenças, lendas, raízes e reverência por seus antepassados – um sinal de sabedoria que poucas nações cultivam.
As indicações, nesta semana e na próxima, serão dedicadas a um pouco dessa cultura contemporânea que tem tomado cada vez mais espaço nos sites, revistas e outras mídias especializadas e que é fonte de fascínio e curiosidade. Uns amam, outros nem tanto, mas com certeza é impossível ficarmos indiferentes a ela.



Indicação de filme
Neko no ongaeshi - O Reino dos Gatos

Duas razões básicas me levaram a indicar essa linda animação: minha paixão por esse universo oriental e minha adoração pelos felinos. O Reino dos Gatos é uma criação de Hayao Miyazaki, um dos mais reconhecidos e respeitados profissionais do cinema de animação japonesa, cujo trabalho ganhou projeção internacional a partir do premiado “A viagem de Chihiro”, em 2003.
O Reino dos Gatos singelamente conta a história de Haru, uma estudante preguiçosa que um dia salva um gato de atropelamento. Na mesma noite ela recebe a visita do misterioso rei dos gatos, que a convida a conhecer seu reino – um lugar mágico onde todos os animais falam e se comportam como gente. O que ela não imagina é que ela será forçada a se casar com o príncipe e assim se transformar em uma gata.
Visualmente agradável e leve – pelos tons pastéis – a animação ainda conta com uma bela trilha sonora e é o tipo de filme que chama a atenção dos públicos adulto e infantil, pois trabalha de modo lúdico uma narrativa simples com um bom ritmo e piadinhas, tudo com um toque de fábula.
Um dos pontos mais encantadores da animação é o fato de os gatos andarem sobre duas patas e elegantemente vestidos – coisa que na vida real seria impossível e desnecessário, além de absurdamente estranho, mas que no filme chega a se tornar engraçado. Outra passagem divertida é quando Haru ganha alguns presentes do rei, agradecido pela garota tê-lo salvado. Um dia ela acorda e se depara com a casa cheia de catnip (a famosa erva dos gatos), deixando os felinos da vizinhança doidões. Numa outra vez Haru abre seu armário da escola e dá de cara com centenas de ratinhos correndo embrulhados com lacinhos. Presentes típicos dos gatos que querem agradar seus benfeitores. Porém, quando Haru fica sabendo dos planos do rei de casá-la com o príncipe, a estudante procura ajuda do Barão Von Gikkingen – um autêntico gentleman, e seu companheiro Muta, um bichano gorducho. Quando este encontro se dá muitas aventuras se seguem e Haru, ao adentrar o reino, vira uma linda gatinha.
É claro que sou altamente suspeita por recomendar esta obra, mas o filme vale muito pela qualidade visual, pela bela história e por representar o melhor do cinema de animação japonesa.


Indicação de leitura
Samurai X - Rurouni Kenshin -
Crônicas de um samurai na Era Meiji

Imagino que quem não curte animês ou mangás, não vai dar importância a essa obra, mas poderia. Mais do que tratar das aventuras de um dos samurais mais famosos e queridos dos otakus, o livro ainda traz passagens importantes e verídicas a respeito da História do Japão - sobretudo durante o período em que os monarquistas tomaram a ilha, dando início à Era Meiji (lá pelos idos de 1867).
Graças à parceria entre Nobuhiro Watsuki (criador do Samurai X) e Kaoru Shizuka (historiador), o leitor pode saber um pouco mais sobre algumas tradições, fatos marcantes e hábitos do povo japonês da época. Por exemplo: foi só no começo da Era Meiji que surgiram os primeiros gyunabe-ya (restaurantes de comida ocidental), em Edo (atual Tóquio) e foi aí que eles finalmente conheceram a carne bovina. O livro explica até como ela era preparada.
Mas além das curiosidades a cerca da sociedade, economia e política japonesas, como não podia deixar de ser, o que prende mesmo é o velho dilema do samurai Kenshin Himura: o de não voltar a usar sua Sakabatou (espada com lâmina invertida) para matar as pessoas - ainda que a tentação seja grande.


No mangá original, Kenshin Himura, aos 14 anos, passou a integrar o exército monarquista, opondo-se ao xogunato (uma ditadura militar feudal), numa das épocas mais conturbadas da história do Japão. Por causa de sua frieza e habilidade com a espada, ele ganhou o apelido de “Battousai, o Retalhador”. Com o fim do conflito, Kenshin torna-se um andarilho disposto a não mais matar as pessoas. Numa dessas andanças ele conhece a jovem mestra Kaoru, que administra com dificuldades o dojo (uma espécie de academia de luta) da família. Depois conhece o “aborrecente” Yahiko e Sanosuke Sagara, um adorável vagabundo e lutador de rua. Eles acabam se tornando a sua família e é por causa deles que Kenshin decide abandonar seu lado Battousai e levar uma vida normal.
Essa novela romanceada traz duas histórias: uma é inédita, em que o livro "Viagem à Lua", de Júlio Verne, gera pequenas discussões entre os personagens - uns acham impossível que um dia o homem pise na Lua, outros preferem acreditar que sim - mas isso é só um pano de fundo para acontecimentos bem maiores, pois o livro é misteriosamente roubado e depois disso Kenshin se depara com forças remanescentes do antigo xogunato. A segunda passagem é tirada do mangá e do anime, só que contada com maior riqueza de detalhes. É sobre uma parte do passado de Sanosuke que volta para assombrá-lo e Kenshin tenta impedir o amigo de se aliar a uma tropa que pretende atacar o governo.
Samurai X tem sido um sucesso em todo o mundo, tanto o anime e os filmes quanto o mangá são instrumentos bem interessantes para conhecermos um pouco sobre o Japão antigo. Além disso, as animações têm uma das melhores trilhas sonoras dos animes com músicas impecavelmente cantada por todos os otakus – e algumas destas provavelmente serão ouvidas na Festa da Cerejeira, como Sobakasu (Judy and Mary), Tactics (The yellow monkey), Heart of sword (T.M. Revolution), It´s gonna rain (Bonnie Pink) e a minha favorita, 1/3 Junjō na Kanjō (Siam Shade).

Samurai X - Rurouni Kenshin - Crônicas de um samurai na Era Meiji
Autor(es): Nobuhiko Watsuki e Kaoru Shizuka
Editora: JBC
Páginas: 174

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Indicação de leitura
Zadig, ou o Destino – História Oriental



Voltaire, ou François-Marie Arouet (1694-1778) é um dos maiores representantes do Iluminismo, e só por isso já o adoro e o recomendo. Entretanto, é ainda um filósofo altamente irônico e sarcástico, apontando as falácias da sociedade através do riso, mostrando quão ridículos são os conservadores e intolerantes.
Suas obras de tão ácidas chegam a ser destrutivas, com o objetivo de atacar os poderosos, os invejosos, os orgulhosos, os fanáticos religiosos, enfim, os mal-amados que, envoltos em sua atmosfera antiquada, pregam o falso moralismo que lhes é tão característico.
E Voltaire, através de sua ironia “gentil” rompe com este cenário e busca novas formas de pensamento, livre, equilibrado, sensato e até bem humorado. É o tipo de pensador que me ganhou como sua fiel seguidora, logo na primeira obra sua que li. Na verdade Zadig foi a segunda. A primeira foi “Tratado sobre a Tolerância”, igualmente apaixonante e bem provocativa para quem tem a mente ainda um tanto fechada, sobretudo quanto às questões da Igreja. Por isso desta vez escolhi Zadig, a fim de evitar maiores confrontos filosóficos.

Zadig, ou o Destino não é um tratado, mas uma novela sobre um filósofo da antiga Babilônia – meio perdido no tempo e no espaço, já que Voltaire não se apega muito a detalhes de datas e mapas. O que ele quer é retratar, através de Zadig e de suas desventuras, as mazelas presentes em seu próprio cotidiano, cutucar as feridas sociais e políticas de seu tempo.
Nesta obra, em que tudo parece estar sempre perdido para Zadig, temos a impressão de que o homem não é e nunca será senhor de seu próprio destino. É como se fossemos marionetes controladas por algo bem maior, por um Destino sacana e sádico que nos leva para onde bem entende, sempre nos testando e rindo de nós. O livro é descrito por alguns estudiosos como uma “história de ortodoxia religiosa e metafísica”, ambas provocadas pela revolução moral que Voltaire plantou em Zadig – personagem com toques orientais, uma vez que o Oriente estava em pauta desde a segunda metade do século XVII. Voltaire, em 1747, “inaugurou” o gênero de contos filosóficos com esta obra, inspirando posteriormente outros gênios, como Edgar Allan Poe.

Zadig tem a noiva raptada e, ao tentar resgatá-la, tem um olho gravemente ferido. O grande médico Hermes tenta lhe dizer que ele não ficará curado, mas Zadig não dá atenção e indo ao encontro da noiva Samira, ele desafortunadamente descobre que ela detesta caolhos e que acabou se casando com o bandido que a havia sequestrado.
A partir daí a vida de Zadig passa por altos e baixos. Muitos mais baixos do que altos, aparecendo em seu caminho pessoas invejosas, dilemas morais e indivíduos ambiciosos.
Através disso, Voltaire fez uma alusão às pessoas de sua época, às arbitrariedades, à intolerância. Com isso, claro, ele colecionou ao longo de toda a sua produtiva vida literária, tanto admiradores quanto inimigos, chegando a passar duas temporadas preso na Bastilha. Ele gostava e sabia viver bem, mas tratava a todos como iguais. Não se prendeu somente à filosofia, mas produziu tragédias, romances, contos, poesias, ensaios e sátiras. Deixou também mais de 10 mil cartas, um verdadeiro baú de documentos jornalísticos.
Zadig é apenas uma das várias evidências da beleza do espírito voltaireano, despido de preconceitos, engenhoso, um pouco maligno às vezes, mas rebelde e repleto de todo o frescor do Iluminismo.

Zadig, ou o Destino pode ser lido em
www.ebooksbrasil.com.br ou www.livrosgratis.net