quinta-feira, 4 de agosto de 2011

TOCA RAUL!

“Eu sempre quis ser cantor, de rock. Foi a única música que me influenciou. Antes disso minha inclinação era a literatura. Estudava muito filosofia, literatura, e não tinha tempo para cantar profissionalmente; nunca havia pensado que a música poderia ser um veículo importantíssimo para dizer o que eu queria. Quando tomei consciência disso foi ótimo. Gosto de falar de mim. Sou individualista. O rock é o melhor ritmo para gente dizer uma porção de coisas.” (Raul Seixas)

Ainda celebrando (sempre) o Dia Mundial do Rock, faço questão de lembrar o nosso rei Raul. Bom, rei talvez não seja um título que agradaria a Raul, creio, pois genioso, era avesso a esse tipo de rapapés. O fato é que Raul é o maior e mais emblemático roqueiro do Brasil. Foi ao exterior e bebeu na fonte de músicos como Elvis (um de seus ídolos maiores) e deu um tempero nordestino a tudo o que absorveu.

Raul Santos Seixas, aparecido em Salvador em 28/6/45 e desaparecido em São Paulo em 21/8/89, acumulou, além do apelido de “Maluco Beleza”, o de “Pai do rock brasileiro”. Ao longo de seus 26 anos de carreira, Raul foi pioneiro quando misturou o rock com o baião. Let me sing, let me sing é a maior referência dessa ousada mistura.



A sua vida foi até relativamente curta, porém intensa, lotada de histórias, trabalhos, desafios e desaforos, criatividade e provocações. Muitos autores tentaram e tentam ainda hoje sintetizar tanta vivência em um livro, mas o trabalho não é fácil. Entretanto, as duas obras que li – até agora – trazem, na medida do possível um apanhado interessante sobre a vida e obra de Raulzito, o canceriano sem lar.

Organizado e ao mesmo tempo solto, Verdade Absoluta é feito de retalhos de depoimentos de pessoas (afortunadas) que conviveram com Raul e que com ele dividiram situações – ora inusitadas, ora comuns, mas que renderam citações, citações que renderam letras, que renderam músicas, que renderam algumas verdades.

Um das (várias) passagens diz que “Inspirado no anarquista francês Proudhon (1809 – 1865), depois que leu ‘Filosofia da Miséria’ e ‘Resistência ao Exército’, decidiu que não iria servir ao Exército. Também não queria prosperar. Proudhon dizia: a prosperidade é um roubo. Iria usar a música para meter a boca, reclamar: ‘Vamos ver agora quem é que vai aguentar!’”.

E um dos pontos mais bacanas do livro, além do óbvio, está nas últimas páginas, com referências organizadas de cada citação, de onde ela saiu e onde ela foi parar. Por exemplo: “Vamos ver quem é que agora vai aguentar”:
Página: 119
Origem: Disco 8 (Há 10 mil anos atrás – 1976)
Consta na música/texto: Eu também vou reclamar
Autores: Raul Seixas e Paulo Coelho

E isso acontece com todas as centenas e centenas de frases de Raul. Ou seja, aqui ele aparece destrinchado, esmiuçado, mastigado – e deliciosamente digerido.

Raul Seixas por ele mesmo foi escrito a partir de entrevistas, frases, declarações, palavras soltas, pensamentos, papéis avulsos, porém reveladores, produzidos durante sua estada por aqui, até o dia em que “o moço do disco voador” o levou. As histórias foram reunidas e organizadas pelo escritor e amigo de Seixas, Sylvio Passos, fundador do Raul Rock Club/Raul Seixas Oficial Fã-Clube. Não é exatamente uma obra autobiográfica, mas por muitas vezes a impressão que temos é que Raul fala diretamente conosco. É como se ele puxasse uma cadeira e se sentasse diante da gente e nos explicasse suas mais simples verdades: “Daí eu juntei Luiz Gonzaga com Elvis. Eu não fiz um ritmo ‘rock-baião’. Isso foi informação musical. Aconteceu! (...) O som de Let me sing, let me sing é de 56; apesar de parecer uma gozação, eu acho esta música seríssima, é apenas o início de um trabalho muito grande que eu pretendo desenvolver degrau por degrau (...) Não tenho estilo, eu tenho é muita coisa pra dizer. E digo (...) Eu creio na abertura mental que vem por aí. Até então as portas estiveram fechadas. Devagar elas vão se abrindo e nunca mais, nunca mais se fecharão”.



Raul por ele mesmo é o nome mais justo que se pode dar a essa obra, pois entre uma declaração e outra é como se ele baixasse um pouco a guarda e fizesse as vezes de um amigo mais velho e experiente que tenta nos levar à luz, ao conhecimento, à liberdade, à pedra do Gênesis, “ao segredo almejado desde a aurora dos tempos por gênios, sábios, alquimistas e conquistadores”, a uma verdade que está bem diante dos nossos olhos, que até podemos tocar.

Raul Seixas – A verdade absoluta – Filosofias, políticas e lutas
Autor: Mário Lucena
Editora: Mac Bel – Oficina de Letras
Páginas: 225
(acompanha CD inédito, com letras feitas para Raul, de Roberto Seixas – amigo e cover de Raulzito)

Raul Seixas por ele mesmo
Autor: Sylvio Passos
Editora: Martin Claret
Páginas: 176



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