quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Fora da Ordem e do Progresso


História, política e aquela sensação de que ainda falta muito, muito mesmo, demais da conta, para que o Brasil entre nos eixos. Três das várias razões que me fizeram comprar essa antologia e devorá-la em um dia. Quase 400 páginas em um dia inteiro (coisa de quem ama ler ou sabe usar o tempo que sobra, ou as duas coisas) é algo que exige que eu volte a esse livro outras vezes. Livro, jornal, documento. Ás vezes tudo isso se confunde nessas páginas, onde a História do Brasil é uma constante e cujas palavras nos lembram do nascimento torto da nossa política.

Cresci num meio em que sempre foi muito falar sobre política. A casa da minha avó, sobretudo em época de eleição, era como uma pequena ágora, onde cada um tinha alguma coisa para falar, alguma notícia para discutir, algum debate para comentar. Tive sorte de sempre estar por perto para ouvir a conversa dos adultos e embora não entendesse uma porção de coisas, fui crescendo e tomando gosto pelo assunto. Talvez de uma maneira até mórbida, porque sei que os tempos românticos da política morreram na Grécia e em Roma há vários séculos. O que nos restou foram cadáveres do que um dia foi uma das mais nobres artes.

E quando essa arte chegou ao Brasil, ela já estava corrompida. E assim permaneceu. Fora da Ordem e do Progresso mostra que praticamente nada mudou desde os tempos em que éramos colônia. Autores como Machado de Assis, Bernardo Guimarães, Nélida Piñon, Lygia Fagundes Telles, Mário de Andrade, Monteiro Lobato, Lima Barreto, João do Rio, Arthur Azevedo, Ignácio de Loyola Brandão, entre outros, através de 27 contos, nos apontam que as tramóias, os interesses escusos, os favores, os “jeitinhos”, os agrados, a violência, a repressão, o povo visto e tratado como um monte de nada são ainda elementos presentes, mesmo depois dos nossos 500 anos de achamento.

Textos como a Teoria do Medalhão, de Machado de Assis, em que um pai incentiva o filho a seguir os caminhos tortuosos da politicagem, ainda que tenha sido escrito em 1882, segue com um discurso muito atual. O texto O Plebiscito, de Arthur Azevedo conta do parlamentar que concorda em ser traído pela mulher, porque isso de alguma maneira vai ajudá-lo em sua carreira, o que nos mostra que nesse meio, a dignidade é um detalhe.

Segundo Império, República Velha, ditadura militar, Nova República. Fases retratadas através de personagens comuns, de gente que poderia estar dentro de nossas famílias, do nosso convívio, da nossa vizinhança. Histórias que alguns de nós provavelmente já ouvimos, de um parente que quase foi preso porque lia demais, de um conhecido cujo filho estudante apanhou em algum porão ou de um sujeito muito esperto que tratou de badalar alguém muito influente para se dar bem. A política nos rodeia o tempo todo (afinal, respirar é um ato político), por isso achei esse livro tão interessante, instigante, fascinante, viciante.

Numa data como essa, nada mais cabível do que lembrar um livro cujo título se encaixa tão bem com a nossa realidade. Sou apaixonada pela história do Brasil e acompanho mais as eleições do que Copa do Mundo, amei esse livro e sei que no fundo há quem ainda acredite que o país tem jeito, porque temos pessoas dispostas a dar um jeito nele. Mas como jornalista, estudante, leitora, cidadã e, sobretudo como eleitora, não consigo ser tão esperançosa. Ainda seguimos fora da ordem e do progresso.

Fora da Ordem e do Progresso
Autores/Organização: Luiz Ruffato e Simone Ruffato
Editora: Geração Editorial
Páginas: 397

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