sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

ENCONTRO COM PESSOAS NOTÁVEIS


Há pouco mais de um ano, andando pela cenográfica e florida Nova Petrópolis (RS), entrei numa livraria procurando pelo melhor souvenir que se pode adquirir numa viagem. Estava numa fase de redescoberta do Oriente, sobretudo das obras indianas e diante de uma prateleira tentadoramente lotada, fiquei na dúvida. O dono da livraria, com uma cara absurdamente intelectual veio até mim e sugeriu um tal de Osho. Fiquei intrigada. Osho. Já me veio à mente a imagens de um desses doutores modernosos que pregam uma auto-ajuda muito da manjada do tipo “fique rico pensando positivo”, o tipo de literatura que me irrita bastante; sou turrona nessa parte, assumo, mas dado o semblante culto daquele senhor, resolvi dar um crédito ao tal Osho – especialmente porque li na contracapa referências e nomes de alguns dos meus imortais favoritos como Pitágoras, Sócrates, Heráclito, Krishna, Buda e Jesus.

E nada como a leitura para nos resgatar das trevas da ignorância – e da arrogância, pois eu me julgava uma atenta pesquisadora dessa cultura e ainda não conhecia Osho, “um místico espiritualmente incorreto”, como ele mesmo se definia. Falar dele, na cultura indiana é tão básico como falar de São Francisco entre os cristãos. E ambos têm suas semelhanças.

Chandra Mohan Jain, nascido na Índia no início dos anos 30, começou sua trajetória espiritual aos 21 anos, numa noite em que disse ter sido tomado por uma grande energia reveladora e uma luz intensa em seu jardim o deixou “chapadão” (palavra dele), ficando em estado contemplativo, sem fome e sem sede por dias, não se sentindo mais dono de si. Aprimorou-se na meditação, divulgando a libertação do ser humano. Osho passou a divulgar ideias que já causavam certo mal estar na época, conceitos ainda hoje levantados e que estão longe de serem concluídos, cutucava instituições como a Igreja Católica dizendo que “o mundo está superpovoado e continua-se pregando contra o controle da natalidade, a pílula, o aborto”. É bom deixar claro que Osho comungava com a cristandade, não com o modo como ela vinha sendo administrada.

Pode soar algo polêmico, mas suas aulas (era formado em Filosofia), palestras e livros buscam nos dar outra visão dos livros sagrados, dos sistemas políticos e dos representantes religiosos, mostrando que o homem deve ser livre, deve buscar o autoconhecimento, deve saber relacionar-se consigo e com o planeta; que os seres humanos, apesar de ainda não saberem são iluminados e que devem desenvolver seu potencial. Dos anos 60 até sua morte em 1990, Osho arrebanhou discípulos, a quem chamava de amigos, criou caso com os Estados Unidos, foi acusado de comunismo, foi chamado de fraude, mas nada, nada ofuscou seus ensinamentos calcados em doutrinas como o budismo e cristianismo. Usando exemplos como Jesus Cristo ele buscava mostrar quanto tempo a humanidade perde competindo entre si, que ensinamos aos nossos filhos o valor do dinheiro mas não o valor de uma rosa, que ensinamos aritmética mas não ensinamos poesia, que só acumulamos bens mas não paramos para contemplar o belo e o simples, que devemos ensinar menos história e mais mitologia, porque a história só conhece a dor e a discórdia.

Seu encontro com pessoas notáveis ainda tem nomes como Bodhidharma, Chuang Tzu, Dionísio, Khalil Gibran, Nietzsche, Krishnamurti, Meera. É engraçado como de repente, tão longe de casa, um desconhecido entra na minha mochila depois habita minha prateleira e ganha minha atenção. Talvez Osho não pretendesse fazer tanto barulho com suas palavras, já que ele amava e se inspirava nos mansos, mas é impossível ficar indiferente à sua desconcertante sabedoria: “A história não fala muito de Jesus – na verdade nada. Se a Bíblia não existisse, não haveria nenhum registro sobre Jesus. E eu gostaria de dizer-lhe que existiram muitas pessoas como Jesus, só que não temos nenhum registro a seu respeito. Essas pessoas eram tão mansas, tão silenciosas, tão harmonizadas que não suscitaram o menor murmúrio. Chegaram e partiram, nem sequer deixaram pegadas. A história não tem registrado os budas (...) parece que nunca existiram (...) parecem manifestações do desejo. Parece aquilo que o homem gostaria que o homem fosse, mas não realidade. Eles eram reais. Eram tão reais que não deixaram traços”.

Encontro com pessoas notáveis
Autor: Osho
Editora: Academia
Páginas: 288

(Jornal Comarca de Garça - Cultura) - 11 de agosto de 2011

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