sexta-feira, 26 de janeiro de 2007

Crianças, poesias e
uma luz no fim do túnel.

“Eu gostaria de ter estudado latim, assim eu poderia me comunicar melhor com o povo da América Latina”.

Antes de qualquer coisa, gostaria de esclarecer que essa infeliz frase foi atribuída ao nosso atual (e, com sorte, nunca mais) presidente Lula. Trata-se de uma das várias pérolas que circulam pela internet e que, sabe-se lá quem, disse ter sido proferida por ele. Pelo sim, pelo não, prefiro acreditar na autenticidade desse tipo de declaração. Combina com Lula. O caso é que me lembrei dessa frase e de outras, e de tantos momentos vexatórios do nosso presidente no dia em que tive uma experiência até então inédita para mim.

A APEG (Associação de Poetas e Escritores de Garça) acabou por se envolver no projeto de Incentivo a Leitura, em conjunto com a escola Edson Puga. A cada sábado, um membro da associação se reúne com crianças – com idade média de 8, 9 anos – a fim de fazer explanações sobre poesias, contos, histórias. Um meio de mostrar às crianças que os poetas e escritores são “pessoas normais”, que o ato de apreciar poesias não é algo elitizado, não depende de idade; as obras estão aí para serem apreciadas. Confesso que no início, quando ouvi falar desse projeto, imaginei que os meus colegas da APEG estivessem tendo um pouco de trabalho para aproximar as crianças da leitura. Afinal, o fato de vermos crianças sendo passadas de ano mal sabendo escrever uma frase conexa, é muito desanimador.

Porém, no dia 16/09, vi bem mais que uma luz no fim do túnel. Para quem diz que a educação está perdida, que criança não gosta de ler, que poesia é maçante, que livro bom é livro que tem figura grande, essa visita seria um tapa na cara. Tive a felicidade de estar com “gente pequena” que aprecia “gente imortal”. Para quem gosta de letras, uma das coisas mais gostosas de se ver é uma criança recitando Cecília Meireles e Vinícius de Morais. E muitas vezes, de cor. Meninos e meninas disputando a vez para ler em voz alta, declamar, interpretar e até fazer seus próprios versinhos, remexendo os livros sem saber qual pegar primeiro. A gente nem percebe o tempo passar. Mas percebe como existe um abismo entre essa “gente pequena” e a pequenez de um presidente que já afirmou que livros são chatos. De um lado, temos crianças fascinadas com histórias, atentas às dicas quanto à postura para ler, tratando os livros com carinho e respeito. De outro lado um ogro (posso ganhar inimigos por dizer isso, mas também sei que muitos hão de concordar) que maltrata a língua portuguesa, que se orgulha de não haver estudado. Se tivesse estudado, não precisaria se prender tanto aos discursos prontos saberia improvisar – quem lê mais, fala melhor. Mas toda vez que Lula resolve inventar seus textos acaba por nos envergonhar. Quem é que não se lembra de uma visita feita ao continente africano, onde soltou essa: “Aqui é tão limpo que nem parece África”. Ou o absurdo mais recente, em que, pelo fato de não ter sido reeleito logo no primeiro turno, tentou justificar o número de votos dados a Alckmin com essa delicadeza de frase: Dessa vez a sabedoria popular não funcionou.

Se a sabedoria não funcionou, então funcionou o que, senhor presidente? A burrice? É assim que o nosso comandante vê grande parte do eleitorado. Burros. Bem, se acreditar que o Brasil AINDA é um país promissor e que a educação tem salvação e é definitivamente a cura para todos os males sócio-econômicos de um país, ainda que em longo prazo (discurso de Cristovam Buarque do qual compartilha Alckmin), então também sou burra. Vivemos numa sociedade de valores invertidos mesmo... Acho que sou burra porque vi que um grupo de crianças se dedica verdadeiramente à leitura e que isso alimenta as esperanças de qualquer um que acredite na educação, que tenha fé no poder das letras, que vê nos livros as melhores armas e que deseja ver longe um presidente que, sem muito esforço, levanta a bandeira da ignorância. Imagino que muitos lulistas fiéis podem dizer que ele não estudou porque não teve chance, coitado... É. Para Machado de Assis as coisas também não caíram do céu e, no entanto ele sempre será Machado de Assis (será que peguei pesado ao compara-los?!). Mas nunca é tarde para estudar latim! A América Latina está doida pra trocar idéias com nosso líder.

Eu sei que é um lugar-comum dizer que as crianças também têm muito a ensinar. Mas realmente, essas crianças me surpreenderam. Certamente são motivo de orgulho para seus professores, seus pais e membros da APEG. Ficam aqui meus agradecimentos à escola Edson Puga e a APEG pela chance de tal experiência. E fica aqui a minha torcida para que os “burros” como eu, que acreditam em novo governo e na educação, façam a diferença nessas eleições.
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(escrito em 04 de outubro de 2006)

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