sexta-feira, 26 de janeiro de 2007

Eu tenho medo do Ronald McDonald

Não. Não se trata de um medo gratuito de palhaços. Apenas desse – e do que ele representa - de um modo particular (além de ser meio esquisito e feio). Desde novembro do ano passado, há um tópico na página de Garça, no orkut, com o seguinte título: “Queremos um McDonald’s em Garça”. Queremos? Alguém aí pediu um McDonald’s? Não convém citar quem lançou essa idéia, mas o erro já começa na afirmação, usando-se a primeira pessoa do plural. Felizmente o dono da proposta não teve muitos aliados (só um e ou outro achou simplesmente “legal”). Na verdade, fiquei feliz por saber que muitos jovens dessa cidade rechaçaram completamente a hipótese de um dia termos em nossa paisagem um par de arcos dourados. Para começo de conversa, não corremos esse risco, uma vez que qualquer unidade de uma grande cadeia de lanches só se instala em uma cidade cuja densidade demográfica atingiu os três dígitos. Mas aí vocês me perguntam: “então por que o medo?”. Bem, vejamos:

Uma empresa como a McDonald’s – que visa lucros acima de qualquer coisa e mascara isso com uma falsa responsabilidade social – num primeiro momento sugere geração de empregos. Ótimo, alguns de nossos jovens sairão da fila de espera e tirarão um troquinho. Trabalharão como uns camelos a fim de conquistar o almejado título de “O Funcionário do Mês” – nada mais que um quadrinho na parede; um símbolo que incita os empregados a competir entre si, a se matar por horas extras enquanto imaginam que estão demonstrando eficiência, quando no fundo, estão sendo explorados e privados de terem ligação com sindicatos. Se falamos de jovens, falemos das crianças: desde cedo são induzidas a comer de modo errado, e que, sem querer parecer trágica, correm o risco de enfartar antes dos 40 anos. Mais do que seduzidas pelo cardápio, as crianças são fisgadas pelas centenas de tranqueirinhas, brindes, caixinhas e brinquedinhos inúteis e descartáveis que acompanham um “lanche feliz”. E tantas embalagens lembram o que? Agressão ao meio ambiente. Uma quantidade incalculável de isopor (material não degradável) e papel é lançada na natureza. Da embalagem, passemos para o lanche. É fato que a McDonald’s devasta áreas de florestas tropicais a fim de manter suas criações de gado e não repõem o que derrubam. Isso levou o Greenpeace a colocar, por várias vezes, a McDonald’s no banco dos réus e adivinhem só quem levou a melhor?

Eu não estou tirando esses argumentos do nada. Além da simples observação, creio também em fontes como a jornalista Naomi Klein – autora do livro “Sem Logo” – e em Morgan Spurlock – diretor do documentário “Super Size Me – A dieta do palhaço”, de 2004. Numa das várias passagens sobre o império McDonald’s, Klein conta uma história, no mínimo revoltante e que compartilhei com meus colegas do orkut de Garça. Simplesmente a empresa resolveu processar um cidadão americano porque seu nome era Ronald McDonald. Coincidência, fazer o quê? Afinal, que tipo de pais pensa em dar ao filho o nome de um palhaço símbolo de uma marca, de propósito? Até mau gosto tem limite. Mc é uma partícula presente na maioria dos sobrenomes de origem escocesa (significa “filho de”), mas parece que a empresa não perdoa nem um caso de ascendência, nem de coincidência. O que a McDonald’s ganha com esse processo, além de esfolar um cidadão cujo dinheiro não lhe faz falta, mas que, provavelmente a ele sim?

Já Spurlock mostra, com o próprio corpo, as conseqüências que uma dieta a base de mcporcarias causa. Fora isso, registra o pouco caso que a empresa tem em relação às informações nutricionais de seus produtos. Numa das cenas, quando ele solicita uma tabela de calorias e valores nutricionais a uma funcionária de uma dessas lojas, tem a triste surpresa de saber que eles não usam mais isso e que a última que restava, foi encontrada escondidinha num depósito. Esse desleixo pode acostumar mal o consumidor que já nem liga mais para o que põe para dentro. Isso me lembra a famosa lenda urbana dos anos 80 que dizia que a carne dos hambúrgueres tinha aquela liga por causa da carne de minhoca – misturada à bovina. Antes fosse verdade: provou-se que carne de minhoca é riquíssima em proteínas.

Além da questão de exploração de funcionários, da “sedução” de criancinhas, dos problemas ambientais e da ingestão de mctranqueiras, quando se tem um McDonald’s por perto (ou um Bob’s, Wendy’s, KFC ou Burguer King), as lanchonetes menores podem tender a morrer. Vem uma grande de fora e esmaga as menores, “filhas da cidade” (e cá entre nós, os lancheiros daqui são bem mais generosos nos recheios e nos preços). Isso não vale. O pai do tópico, o da proposta indecente, ainda teve a pachorra de argumentar o seguinte (palavras do próprio, com erros de português incluídos no pacote): “depois os garrrrrrcenses não sabem por que a cidade não cresce!!! sabe por q??? por q vcs não aceitam o progresso vcs se fecharam num mundinho de carrinho de hamburguer!!!fala serio Garaça não vai por causa da mente fechada de certos moradores”.

Vocês entenderam, garcenses? Não passamos de gente atrasada, cabecinha fechada, avessa ao progresso. Para que nossa cidade progrida e prospere só precisamos de um McDonald’s! Como não pensamos nisso antes? Precisou um gênio da língua portuguesa e um exemplo de polidez nos abrir os olhos. E eu que sempre pensei que progresso e civilidade viessem de uma boa educação, de boas escolas, da valorização dos frutos e da cultura da nossa terra, de colaborar com a limpeza da cidade, de não depredar patrimônios públicos, de espalhar cordialidade... Agora é que me caiu a ficha de que o progresso se resume em 2 hambúrgueres, alface, queijo, molho especial, cebola e picles num pão com gergelim. Ah, e fritas acompanham!
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(escrito em 25 de novembro de 2006)

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