sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

Muito barulho por nada



Impossível ficar sem falar de William Shakespeare por muito tempo. Todo apaixonado se sente assim, incompleto se não menciona de vez em sempre o objeto de sua adoração. E como já disse outras vezes, sou irremediavelmente enamorada por esse inglês, cuja existência ainda é posta quem dúvida por alguns, mas para mim, Stratfordon-Avon não poderia ter dado melhor presente ao mundo do que William.

O autor passeia confortavelmente entre drama, tragédia, romance e comédia e trouxe à luz alguns dos personagens mais marcantes da literatura universal, fora os diálogos ora profundos, ora mordazes, ora engraçados e doces.
Esse é o caso de Muito barulho por nada, onde – assim como em As alegres matronas de Windsor, A megera domada e o Mercador de Veneza – as falas são ágeis, irônicas e divertidas. São verdadeiros duelos, ou como alguns estudiosos dizem, combates entre esgrimistas das palavras. E certamente essa é uma das razões pelas quais tenho tanto amor por William. O raciocínio rápido das personagens para dar respostas inteligentes revela alguns traços da personalidade dele mesmo, creio. E pessoas inteligentes que são ao mesmo tempo refinadamente divertidas são, sem dúvida, as mais interessantes.

Muito barulho por nada é uma das comédias mais famosas e queridas do bardo. Nela, Beatriz e Benedicto, totalmente avessos ao casamento, se vêem em situações em que sua paixão se mostra descaradamente visível, embora eles jurem por tudo o que há de mais sagrado que eles não se suportam.
Enquanto o ácido casal teima com isso, a história conta com uma pitada de maldade e inveja por parte de Don John. Tudo começa quando o príncipe Don Pedro, Don John (seu irmão mau caráter) e os nobres Claudio e Benedicto vão descansar de uma guerra na Vila Messina, onde uma grande festa os aguarda, regada a bailes, diversão e paixões. São recepcionados pelo nobre Leonato, cuja filha Hero é o amor de Claudio. O jovem casal combina o casamento e armam um esquema para unir os turrões Benedicto e Beatriz. Don John, que tem inveja de Claudio, monta uma cena para faze-lo crer que Hero a trai com outro homem. Claudio cai no embuste e humilha a moça, desmanchando o casamento. A noiva desmaia e Leonato conta a todos que a filha morreu. Logo o inferninho montado por John é descoberto e Leonato oferece a mão de uma prima de Hero a Claudio – é incrível como tudo se resolvia dando a mão dos outros em casamento – e ele, ainda arrasado e de luto, aceita. Mas o que não se sabia é que Leonato tinha contado uma mentirinha (que não será revelada aqui). E quando Beatriz e Benedicto, o casal (às avessas) mais interessante, percebem as combinações para junta-los, é tarde: os encantadores falastrões já estão apaixonados.

A peça deu origem a um filme igualmente delicioso, em 1993. Muito barulho por nada/Much ado about nothing, tem roteiro e direção de Kenneth Branagh, que também faz o charmoso Benedicto. O filme, que conta com elenco bem interessante, foi o mais aplaudido no Festival de Cannes daquele ano. Prova de que Shakespeare é realmente imortal, aplaudido, encenado e filmado em qualquer época, em qualquer lugar.
O verdadeiro gênio continua vivendo através de suas personagens e de seus brilhantes diálogos e suas frases que se aplicam não apenas às suas histórias, mas às nossas. Como diz Benedicto, “todo mundo é capaz de dominar uma dor, exceto quem a sente”. E não é? William sabe traduzir, como poucos, os nossos muitos barulhos por nada de todos os dias.

Muito barulho por nada
Autor: William Shakespeare
Editora: L&PM Pocket
Páginas: 150

15 de setembro de 2011 (Jornal Comarca de Garça - Cultura)

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