sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

O mundo acabou!




Rural Willys. Pente Flamengo. Cobertores Parahyba. Aparelho de TV Colorado. Monark Pneu Balão, “Fenemê”. Vemaguet. Crush. Drops Dulcora. Cigarros Mistura Fina. Boneco Mug. Glostora. Emulsão Scott. Calças Far-West. Nomes que para muita gente da minha geração podem soar como totalmente desconhecidos, para mim soam altamente familiares. Não, nunca menti a idade. Tenho quase 32, mas como sempre tive mania de passado, conheço todas essas coisas e outras mais que não fizeram parte da minha história, mas que ainda assim, me deixam nostálgica.
Minha avó tinha uma coleção de revistas Seleções – as mais “novas” deviam ser dos anos 70, e eu tinha paixão por aquelas páginas, especialmente as de propaganda. Certamente por isso gostei tanto desse livro.

De autoria do jornalista e escritor mineiro Alberto Villas, o livro nos leva por um verdadeiro passeio pelos anos 50 e 60, através de passagens de sua vida, mas que se repetem na vida de muitos cinquentões de hoje. A viagem é tão boa, tão leve e por vezes tão engraçada que quando nos damos conta, já acabamos de lê-lo e o que nos resta é um apanhado de boas memórias, uma nostalgia e uma pena porque esse mundo realmente acabou.
Hoje os apelos são outros, as propagandas estão mais incisivas, apesar de muito inteligentes. Mas o livro nos arranca risadas ao relembrar de como a publicidade daqueles tempos incitavam a uma certa dose de “terrorismo de mãe”: era comum dizer que se as crianças não tomassem a Emulsão Scott, iam ficar nanicas e burras.

Hoje talvez isso fosse inadmissível, mas funcionou naqueles tempos e ninguém se revoltou por causa desses dizeres. A impressão que eu tenho é que antes não havia tantos melindres como hoje. As crianças eram menos frescas, eram criadas com mais simplicidade, com mais doses diárias de realidade, com mais comedimento, com mais “nãos”, mas nem por isso com menos carinho. Vivemos na época do politicamente correto, mas as caretices continuam as mesmas. Não pode falar para a criança que ela vai crescer burra, mas pode mostrar a bunda no comercial. Onde está a modernidade nisso?

O mais curioso é que esse livro teve o poder de me transportar para uma época que eu não vivi! E ainda senti saudades daquilo tudo! É engraçado ver como as novidades daqueles dias, que para nós hoje já são mais que ultrapassadas, eram vistas. O Brasil estava em franco processo de industrialização, os movimentos dos intelectuais eram notórios, a americanização começava a invadir a moda, a música, as gírias e ainda assim tudo parecia mais inocente, mais cordial, menos estressante. De certo modo, o livro não deixa de ter seu conteúdo histórico, pois retrata os costumes e o modo e vida de toda uma geração de brasileiros, não importando se esses brasileiros falam de Belo Horizonte ou Brasília, como o autor, ou dos cafundós do interior de São Paulo, como minhas tias, ou como pais e avós de muitos de nós.

É claro que muitos hão de se lembrar que aqueles tempos também podem remeter a dias difíceis, como a ditadura, mas o propósito não é esse. Pelo contrário. O Mundo acabou serve como um respiro, um momento para deixar de lado as pequenas agruras do século XXI e ter alguns minutos de delicadeza, de se deliciar com amenidades, de relembrar dos pequenos, e até modestos, sonhos de consumo dos tempos em que os jovens andavam contentes da vida quando desfilavam com um Bamba.

O mundo acabou
Autor: Alberto Villas
Editora Globo
Páginas: 308

01 de setembro de 2011 (Jornal Comarca de Garça - Cultura)

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