quarta-feira, 7 de março de 2012

A Moreninha

Sei que parece meio clichê, mas desta vez fiquei pensando em um livro que tivesse a ver com o Dia da Mulher. Pensei em grandes poetisas ou figuras históricas, pintoras e cientistas. Florbela Espanca, Tarsila do Amaral, Clarice Lispector, Madre Teresa, Anne Frank, Marie Curie, Frida Khalo, Olga Benário, Cecília Meireles, Joana d’Arc, Maria de Nazaré. São tantas mulheres imortais, fortes, decididas, à frente de sua época, mártires, brilhantes. Falar delas numa data como hoje seria mesmo um clichê.
Então resolvi falar de uma mocinha que também se imortalizou em nossa literatura, uma adorável aborrecente, um tanto infantilizada, caprichosa, mimada, mas muito esperta e apaixonada. Carolina. A moreninha. Protagonista da obra de Joaquim Manuel de Macedo, bem como a maioria das personagens do livro, representa a juventude burguesa carioca do século XIX. Descompromissada, meio cabecinha de vento, mas ainda com uma certa inocência.
O livro foi escrito em 1844 e é tido como o primeiro romance tipicamente brasileiro. Entretanto se houvesse uma categoria além do Romantismo, algo como “Romantismo com pouca água e muito açúcar”, A Moreninha se encaixaria aí. Não que a obra seja enfadonha. Pelo contrário! É uma leitura gostosa, divertida e não deixa de ter o seu lado quase documental ao retratar alguns aspectos históricos como o comportamento da burguesia, as vestimentas, as festas, o pensamento da época.
A trama é bem simples e nos faz criar um paralelo entre a juventude daqueles tempos e a de hoje. Por vezes já quis ser uma espécie de Carolina, feliz e protegida numa redoma de alienação e meras dúvidas juvenis. A história gira em torno de uma aposta feita entre quatro amigos: Augusto, Leopoldo, Fabrício e Felipe, todos estudantes de Medicina. Sabendo que Augusto tinha fama de conquistador e que não conseguia ficar com a mesma moça por mais de quinze dias, seus amigos apostaram que se alguma vez ele se apaixonasse de verdade e ultrapassar os 15 dias, Augusto deveria escrever um romance.
Um dia eles foram convidados por D. Ana, avó de Felipe, a passar o dia em uma ilha de sua propriedade, onde haveria uma festa (geograficamente falando, era a Ilha de Paquetá), e lá Augusto se encantou por Carolina, irmã do amigo. A mocinha, embora negasse até a morte e desdenhasse de Augusto o tempo todo, também se sentiu atraída pelo estudante. Durante a festa, recheada de cenas e diálogos engraçadinhos, os amigos de Augusto espalhavam sua má reputação de “galinha”, o que provocava Carolina, que como uma típica criança espoleta, dava vários foras no moço.
Augusto chegou a confessar à D. Ana que ele se comportava assim e nunca assumia nenhum compromisso porque quando era criança, ele jurou amor a uma menininha que conheceu na praia e com quem trocou um breve (tipo de camafeu), mas que nunca mais a vira e nem soubera o nome. E que ao estar se apaixonando por Carolina ele sentia como se estivesse quebrando sua promessa e traindo a tal menininha.
Entre suspiros, xingamentos, olhares e foras, Carolina e Augusto se gostavam cada vez mais, e a espevitada moreninha acaba fazendo com que ele quebre essa promessa. E Augusto o faz de bom grado, quando descobre a ligação de Carolina com a menininha da praia. Quem leu ou um dia, quem sabe, ler o romance, entende ou entenderá como isso se deu e o que essa “patricinha do século XIX” tinha a ver com essa jura do passado, tão sincera e inocente.
Lembrei-me das grandes mulheres e também da Moreninha no Dia da Mulher, pois por mais fortes que muitas de nós sejamos, um dia fomos menininhas, um dia fomos mocinhas e essas versões de nós mesmas nos trouxeram até aqui, às mulheres que somos hoje.


Cartaz do filme, de 1970

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